Vozes do GrowLIFE
A série Vozes do GrowLIFE pretende apresentar uma visão abrangente do nosso projeto. Através de uma série de entrevistas, queremos dar a conhecer as suas várias dimensões e intervenientes, incluindo a equipa que desenvolve o projeto, agricultores, decisores políticos, chefes de cozinha, e outros atores relevantes do sistema alimentar.
Sara Magalhães
Professora Catedrática da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e Investigadora no Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais. Coordenadora da iniciativa Caravana AgroEcológica
Olá Sara, podes apresentar-te e apresentar o teu papel no projeto GrowLIFE?
Olá, o meu nome é Sara Magalhães, eu sou professora da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, em Biologia, nomeadamente em Ecologia e Evolução, e também sou investigadora no Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais. Eu trabalho com uma praga de cultura muito conhecida, que são os ácaros herbívoros, que comem muitas plantas que são de interesse económico para os seres humanos, dado que nos alimentamos delas, como, por exemplo, o tomate, o melão, o feijão, o morango, etc.
E, a partir daí, surgiu a ideia de fazer um projeto um pouco mais direcionado, diretamente para a sociedade, que é o GrowLIFE, do qual sou coordenadora.
Como se identificaram os principais grupos a envolver no projeto para enfrentar o desafio de transformar o sistema alimentar local e porquê?
O GrowLIFE parte de uma filosofia em que não é possível transformar apenas um setor do sistema alimentar, porque para alterar um sistema, temos que alterar todas as pequenas parcelas desse setor. A nossa filosofia sempre foi esta desde o início, já na Caravana Agroecológica é também esta a nossa filosofia. E, portanto, aqui a ideia é juntar e estabelecer pontos de contacto entre todos os envolvidos no sistema alimentar, começando pelos produtores, que produzem os alimentos, os distribuidores, os municípios e as autoridades locais, que são as pessoas que decidem as leis sobre como é que se vende e onde se vende, como é que se produz e onde se produz, e também os consumidores, porque sem os consumidores também não há produção. Dentro desses consumidores identificámos um tipo especial de consumidor que são os chefs, as pessoas que transformam os alimentos em refeições de forma profissional, que não só são consumidores importantes, como também influenciam muito os outros consumidores e, nesse sentido, são muito importantes para nós, porque o que queremos mesmo é mudar o sistema alimentar de forma visível, de uma forma consequente.
O que prevês alcançar nos 5 anos do projeto?
O que nós gostaríamos mesmo era de mudar o mundo, parece-me um pouco difícil de fazer isso em cinco anos, e mesmo mudar o sistema alimentar também me parece um pouco difícil de alcançar em cinco anos.
No entanto, se nós fomentarmos a conexão entre todos os stakeholders envolvidos no sistema alimentar, que estão interessados numa agricultura e consumo sustentável, nós acreditamos que esse sistema alimentar mais sustentável vai ser mais robusto e que se vai manter de forma mais prolongada. Portanto, por um lado, nós queremos fortalecer as relações entre as pessoas que já estão interessadas em produzir e consumir alimentos produzidos de forma sustentável; por outro lado, queremos também angariar mais pessoas que estão um pouco sensibilizadas, mas que ainda não entraram nesta ideia de produzir ou consumir de forma sustentável. Assim, temos dois objectivos diferentes: um, é fortalecer as relações entre pessoas já interessadas num sistema alimentar sustentável; e o outro é conseguir incentivar outras pessoas a consumir de forma mais sustentável.
Tendo em conta a natureza ambiciosa deste projeto quinquenal, como prevês navegar na realidade de que a mudança sistémica requer frequentemente mais tempo do que este prazo permite? Podes explicar como este projeto se enquadra numa visão mais ampla e de longo prazo para a transformação do sistema em causa?
Tal como eu disse, eu tenho consciência que nós não vamos conseguir alterar o sistema alimentar em 5 anos. Primeiro, porque não temos esse poder. E segundo, porque 5 anos é muito pouco tempo. E para além disso, o sistema alimentar está inserido na sociedade, nós acreditamos que só podemos mudar o sistema alimentar quando mudarmos a forma como o ser humano se relaciona com a natureza. E isso está completamente fora do alcance deste grupo de pessoas que está dedicado ao projeto, por muito maravilhosas que elas sejam. No entanto, a nossa ideia é sermos catalisadores de estabelecimento de relações, e conseguir que as pessoas que realmente estão no sistema alimentar conversem mais entre elas, que comuniquem mais e que alterem os comportamentos dentro do sistema alimentar, mas que depois isso perdure para além da nossa existência. Nós, no fundo, estamos só a catalisar um acontecimento que depois irá perdurar no tempo sem a nossa intervenção, esperamos nós.
Quem são os parceiros do projeto GrowLIFE?
O projeto GrowLIFE nasceu da nossa Caravana Agroecológica, que é um grupo de pessoas interessadas em tornar o sistema alimentar mais sustentável, que faz parte da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, e da nossa parceria com a Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa. Há alguns anos antes da existência deste projeto nós já tínhamos uma relação com a Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa, tínhamos feito um Dia Aberto de Produtores lá, tínhamos conversado várias vezes com eles e percebemos que eles também estavam interessados em promover um sistema alimentar mais sustentável.
Assim, os parceiros do GrowLIFE são a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, na qual nós nos inserimos, que tem uma entidade afiliada que é a Fciências.ID que permite o estabelecimento e a execução dos projetos, e o Turismo de Portugal com todas as suas Escolas de Hotelaria e Turismo, porque pareceu-nos que era interessante envolver todas as Escolas de Hotelaria e Turismo de Portugal e não só a de Lisboa para termos alguma projeção territorial.
E como é que o projeto é financiado?
O GrowLIFE é cofinanciado pelo Programa LIFE, o instrumento de financiamento da União Europeia para o ambiente e a ação climática. Este Programa LIFE financia vários tipos de projetos, em particular que contribuem para a descarbonização e o crescimento sustentável, em linha com o Pacto Ecológico Europeu. Podem ser projetos mais de conservação da natureza, ou mais de construção de uma coisa ou infraestrutura específica, mas no caso do GrowLIFE é um projeto de Governação e informação em matéria de clima.
Que mais gostarias de partilhar?
Eu gostaria de dizer que realmente há muitas coisas a acontecer e muitas pessoas conscientes de que as alterações climáticas estão aqui, que temos que fazer qualquer coisa, para irem para a rua, e fazerem manifestações, etc. No entanto, a mim parece-me que uma forma muito concreta e muito eficiente de lidarmos com, ou de conseguirmos combater as alterações climáticas é a forma como nos alimentamos. Porque se nós conseguirmos reduzir o uso de alimentos que dão a volta ao mundo antes de chegar ao nosso prato, estamos a contribuir de uma forma massiva para diminuir as alterações climáticas e estamos a fazer isso com um hábito que nós temos todos os dias, que é alimentar-nos. Portanto, parece-me extremamente importante que as pessoas vão ganhando consciência para a necessidade de nós mudarmos o sistema alimentar, e de consumirmos produtos locais para conseguirmos combater as alterações climáticas.
Acompanha-nos à medida que exploramos as histórias e experiências que constroem o GrowLIFE e nos aproximam de um sistema alimentar mais saudável e sustentável.